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quinta-feira, 1 de setembro de 2011
"SIGAM O DINHEIRO" ESCÂNDALO NA BAHIA, PARA VARIAR....
Operação Alquimia
É preciso seguir o dinheiro
Foragido na Espanha, Paulo Sérgio Costa Pinto Cavalcanti, mentor da fraude bilionária, descansava ao lado de James Correia, secretário de Jaques Wagner, e do empresário Carlos Suarez, ex-sócio da construtora OAS
Bruno Abbud
Paulo Sérgio Costa Pinto Cavalcanti frequenta círculos íntimos do poder na Bahia (Renato dos Anjos)
De acordo com o inquérito que desencadeou a Operação Alquimia, ao qual o site de VEJA teve acesso, a Sasil e as empresas que orbitam ao seu redor têm entre seus clientes “órgãos públicos das esferas municipal e estadual, em especial do estado da Bahia”.
Enquanto a Polícia Federal mobilizava agentes para deflagrar no Brasil a Operação Alquimia, há duas semanas, o empresário baiano Paulo Sérgio Costa Pinto Cavalcanti, principal alvo dos policiais, assistia a tudo muito bem instalado na região da Galícia, noroeste da Espanha. Ele é proprietário da Sasil Comercial e Industrial de Petroquímicos Ltda., acusada de encabeçar uma sofisticada rede de compra e venda de produtos químicos que prosperava com a sonegação de impostos. Pelo menos 1 bilhão de reais foram surrupiados dos cofres públicos. Do outro lado do Atlântico, Cavalcanti não estava sozinho. Tinha a ilustre companhia de James Correia, secretário da Indústria Comércio e Mineração do governo da Bahia, e de Carlos Seabra Suarez, ex-sócio da construtora OAS e poderoso empresário do ramo imobiliário e de energia.
Os conterrâneos aproveitavam a temporada na Europa para desfrutar de uma festa que a família de Suarez promove anualmente naquela região da Península Ibérica. Ao saber que a devassa em seu patrimônio havia começado, Cavalcanti decidiu entregar-se na segunda-feira, 22 de agosto – cinco dias depois da operação. Três dias antes, na sexta-feira, James Correia desembarcou em Salvador com um discurso ensaiado: “A Operação Alquimia foi mais uma operação pirotécnica da PF”, discursou durante uma entrevista ao site Bahia Econômica. "É preciso colocar nariz de palhaço para acreditar que a Sasil, que fatura 500 milhões de reais por ano, vá sonegar impostos no montante de 1 bilhão de reais”.
A Sasil é investigada por patrocinar a criação de centenas de empresas de fachada que, usando “laranjas”, compravam lotes de insumos petroquímicos sem pagar impostos e os repassavam para a Sasil. Quando a Receita Federal aparecia para cobrar a dívida, as empresas fantasmas decretavam falência. Como a lei impede a dupla tributação sobre os produtos, a Sasil permanecia livre dos impostos. O valor lucrado com a sonegação era repassado a Cavalcanti por meio da Sasil e enviado a paraísos fiscais. De posse de empresas estrangeiras sediadas nas Ilhas Virgens Britânicas, o mesmo dinheiro era enviado de volta às empresas ligadas a Cavalcanti.
Desencadeador da Operação Alquimia, o inquérito 134/2002, ao qual o site de VEJA teve acesso, revela os valores movimentados pela Sasil entre 1997 e 2009. De acordo com o documento, “a comparação entre a movimentação financeira e o faturamento bruto declarado da empresa pode configurar omissão de receita ao Fisco Federal”. Os números mostram também que, de 2008 para 2009, as movimentações financeiras da empresa de Cavalcanti cresceram 4.405%. Em 2008, a Sasil movimentou 472,1 milhões de reais. Em 2009, foram 21,2 bilhões de reais.
Triangulação ─ Paulo Cavalcanti, James Correia e Carlos Suarez são mais do que companheiros de viagem. Formam um triângulo de interesses comuns e se protegem mutuamente. A Sasil, tão defendida por James Correia, forneceu carregamentos de cloro por 10 anos para a estatal Empresa Baiana de Água e Saneamento (Embasa). De acordo com o inquérito, a Sasil e as empresas que orbitam ao seu redor têm entre seus clientes “órgãos públicos das esferas municipal e estadual, em especial do estado da Bahia”.
Na prática, nada impede que uma empresa do porte da Sasil – quarta maior distribuidora de produtos petroquímicos da América Latina, com faturamento de 300 milhões de dólares em 2010 – feche contratos com qualquer governo estadual. Ainda assim, é intrigante a presença de um secretário de estado ao lado de um foragido da Justiça acusado de protagonizar um dos maiores casos de sonegação de impostos da história da República. O que teria levado um representante do poder público a desmerecer a Polícia Federal para sair em defesa de um empresário? A resposta pode estar no terceiro integrante do trio da Galícia, Carlos Seabra Suarez.
Suarez é o “S” da construtora OAS. Deixou a sociedade em 1997, depois de se desentender com os sócios. Em 2010, ao lado da ex-mulher Abigail Silva Suarez, doou meio milhão de reais à campanha de Jaques Wagner, atual governador da Bahia, eleito pelo PT. O casal também doou 300.000 reais ao comitê do partido. Suarez colaborou em menor escala com a campanha de Paulo Souto, do DEM, que ficou em segundo lugar. Para o partido da oposição, o empresário baiano doou 100.000 reais.
Suarez é intimamente ligado a Paulo Sérgio Costa Pinto Cavalcanti. Nos anos 1980, os dois amigos compraram ilhas vizinhas na Baía de Todos os Santos. A ilha de Itaipuca, arrematada por Cavalcanti e seu irmão, Ismael César, foi confiscada pela Receita Federal durante a Operação Alquimia. A “ilha de Suarez”, como é chamada por pescadores soteropolitanos, fica bem em frente à dos Cavalcanti, perto da Ilha dos Frades.
O nome de Carlos Seabra Suarez está incluído no inquérito da Operação Alquimia como “pessoa física que apresentou algum tipo de vínculo com a organização criminosa investigada”. Suarez é o atual presidente do Conselho Curador da Fundação Baía Viva, instituição que presidiu em dezembro de 1999. Dessa época até maio de 2000, Cavalcanti atuou como diretor da Fundação e usou o cargo para contratar empresas ligadas ao esquema de sonegação fiscal. Entre elas, a Star Ambiental, que fechou um contrato no valor de 2 milhões de reais para instalar banheiros químicos na Ilha dos Frades e outras ilhas vizinhas. “Se as apurações descambarem para o lado de Suarez, haverá muito pano para a manga”, afirmou uma das autoridades que acompanha de perto as investigações. “Carlos Suarez é muito conhecido nos meios da PF”.
Há pelo menos mais um vínculo entre Cavalcanti e Suarez. Anita Maria França Cavalcanti, ex-mulher de Paulo, e Maria Paula Lanat, namorada de Suarez, possuem um fundo de investimento de 32 milhões de reais. Criado em abril de 2007, o Fundo de Investimento em Direitos Creditórios Trademax Petroquímico é alimentado por valores recebíveis das empresas-cedentes Sasil, Triflex, Varient e Braskem. Segundo o inquérito, Anita e Maria Paula são as únicas cotistas, e a Sasil, que de acordo com a PF costumava receber dinheiro lavado de empresas estrangeiras, é a cedente líder. Um dos agentes escalados para desvendar a rede encabeçada por Cavalcanti afirma que “a Sasil é somente a ponta do Iceberg”.
No início da década de 1970, o informante conhecido pelo codinome Deep Throat (Garganta Profunda) deu um conselho aos jornalistas Bob Woodward e Carl Bernstein, do Washington Post: “Sigam o dinheiro”. A dupla atendeu à sugestão e acabou descobrindo que a invasão da sede do Partido Democrata no Edifício Watergate estava diretamente ligada ao presidente americano Richard Nixon, que se viu obrigado a renunciar. Quarenta anos depois, a mesma recomendação poderá revelar o que acontece quando integrantes do governo estabelecem com criminosos relações perigosamente promíscuas.
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